sábado, 18 de abril de 2015

É mesmo a “corrupção” que deixa a elite brasileira furiosa?





O problema da elite e de parte da classe média brasileira não é a corrupção. Para o doutor em

Economia Róber Iturriet Avila, insatisfação tem mais a ver com ascensão social e aumento do poder

aquisitivo das classes menos favorecidas. “Na história do Brasil, sempre que o salário mínimo e a renda

média subiram, houve algum tipo de intento golpista”

corrupção golpistas elite brasileira


Três intelectuais de relevo trataram recentemente acerca do ódio ao PT: Leonardo Boff, Luis
Fernando Veríssimo e Luiz Carlos Bresser Pereira.Suas palavras têm a lucidez de quem enxer-
ga além das aparências e do senso comum.Embora o momento corrente não seja corriqueiro,
um olhar histórico traz ensinamentos.
Na Revolução Francesa, por exemplo, na aparência havia uma ruptura lastreada   em  novos
valores: Liberté, Egalité, Fraternité.O pano de fundo real era, entretanto, a emergência de um
novo grupo. Em meio a um período econômico conturbado,a burguesia degolou o poder polí-
tico e o status social da aristocracia.
No Brasil, a constatação de que a escravidão foi excessivamente longa já sinalizava  que  o
arranjo da sociedade é deveras estamental.Políticas progressistas sempre encontraram fortes
barreiras conservadoras.
Os conflitos de 1954, por exemplo, foram intensos. Na superfície, o governo estava cercado
diante dos “escândalos” de corrupção.A constante oposição na imprensa desgastava Vargas.
Em 1954, o então presidente aumentou o salário mínimo em 100%.Quem não é ingênuo sabe
que Vargas estava contrariando interesses empresariais, tanto com a concessão de  direitos
trabalhistas e civis, quanto com ampliações salariais. O suicídio foi a saída honrosa ao cerco
montado.
João Goulart foi presidente em um período de conflitos. Seu governo concedia elevados au-
mentos salariais,prometia reforma urbana,voto de analfabetos,elegibilidade de todos brasilei-
ros, reforma agrária, concessão de terras a trabalhadores rurais, justiça social, emancipação
dos brasileiros. Caiu! O receio do “golpe comunista” foi o discurso raso que justificava.
Vargas e Goulart saíram do poder ao tempo em que concediam direitos sociais, sobretudo aos
menos favorecidos. Não é novidade que durante os governos do PT, os trabalhadores amplia-
ram sua renda,o salário mínimo cresceu de maneira contínua e houve uma série de programas
sociais.
Não surpreende que,mais uma vez,setores da sociedade brasileira se ergam contra tais políti-
cas, ainda que, escamoteadamente, o bordão seja “contra a corrupção”.
Evidentemente, existem elementos factuais dos governos Lula e  Dilma  que  causaram  des-
conforto e indignação a todos os cidadãos. Contudo, é preciso muita inocência para imaginar
que as manifestações contra o governo são incentivadas pelo descontentamento com  a  cor-
rupção, pela elevação do preço do combustível ou da energia. Quem tem conhecimento histó-
rico e compreensão profunda da sociedade não ignora a ojeriza existente a um programa que
garante R$ 35,00 para os pobres. O ódio não é ao PT.
Conhecendo um pouco mais dos dados do Brasil se observa que houve dois momentos de
crescimento relevante do nível dos salários: no período Getúlio Vargas – João Goulart e nos
governos do Partido dos Trabalhadores. Os gráficos abaixo não apenas demonstram esses
movimentos como indicam que presentemente o excedente operacional bruto caiu em relação
ao produto total em detrimento do incremento nos salários. Interesses poderosos estão sendo
feridos. Não apenas segmentos estão perdendo, em termos relativos, como também regiões.
Será mesmo preciso pintar de azul em um mapa qual região perde mais com a solidariedade
distributiva?
salario2
salario3
salario4
*Doutor em economia, pesquisador da Fundação de Economia e Estatística e professor da
Universidade do Vale do Rio dos Sinos.

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